Por Adriana Araújo, escritora e moradora da cidade.
Nem parece aquela rua de terra, sem asfalto! Aquele poeirão que pairava no ar e aquele deserto residencial e comercial que reinava no lugar. Era uma verdadeira cidade dormitório. Até o pão era difícil encontrar por aqui. Aproveitávamos a ida aos bairros vizinhos pra comprar o que faltava e abastecer a dispensa. Quando nos mudamos para Águas Claras em 2002, nem Região Administrativa era, já que isso ocorreu em 2003. Fiquei assustada! Onde será que tinham arrumado um nome tão bonito para uma cidade tão inacabada? Logo fiquei sabendo que a origem do nome era devido ao córrego que nascia na região e abastecia o Lago Paranoá. Lindo nome por sinal. A verdade é que, pra mim, naquela época, parecia mais a cidade da poeira e do caos do que das águas. Se chovia então… era uma lama só. Estava mais para Águas Escuras. Considerada o maior canteiro de obras da América Latina em 2010, as obras estavam espalhadas por todos os cantos. Sinal de que muita gente ocuparia aquela verticalidade em breve. Inicialmente, o parâmetro era de 12 andares, porém, com o tempo, por pressão de construtoras, as projeções ocuparam outros patamares e a verticalidade mais que dobrou, assustando os que já estavam e aqueles que planejavam viver aqui. A vista da nossa janela, voltada para a linha do metrô era espetacular. Avistávamos toda a imensidão do parque se confundir com o horizonte à nossa frente. Apesar da visão hoje reduzida, temos ainda uma bela vista! Ah, o metrô, este serpenteia em meio ao concreto, dividindo a cidade em sul e norte e é uma grande facilidade. Ter o metrô por aqui é algo muito favorável, principalmente pra aqueles que podem contar com o transporte para ir ao trabalho, à escola, e fugir um pouco do trânsito engarrafado e diário da cidade. Infelizmente, o trânsito, desde o início, sempre foi o grande vilão. As vias eram de mão dupla, ruas apertadas, sem calçadas. Ou seja, aqueles que resolveram morar aqui no início precisaram ter muita coragem e paciência.
Mas, como tudo na vida, algumas dessas imagens ganharam outras perspectivas e cenários. Águas Claras completa duas décadas de existência, cresceu e tem progredido muito. O Parque, o pulmão da cidade, foi aprimorado, recebe milhares de moradores para prática de esportes e atividades culturais. As ruas ganharam mão única, avenidas novas surgiram, alterações e transformações ocorreram em relação ao trânsito. Infelizmente, o problema das avenidas não foi resolvido; parafraseando Carlos Drummond de Andrade “no meio do caminho tinha um concreto”, assim, ruas e avenidas, espremidas em meio às construções, não puderam ser alargadas. Falta de planejamento? Talvez. A cidade projetada pelo arquiteto e paisagista Paulo Zimbres cresceu e continua crescendo em meio aos arranha-céus e depara-se com a poesia em meio ao tangível. Ruas, praças e avenidas têm nomes inspirados no paisagismo. Árvores cruzam nossos caminhos e nos remetem a grandes jardins onde reinam espécies como Flamboyant, Buriti, Araucárias, Castanheiras, Jequitibá, Pitangueiras, Ipês e muitas outras. Sem falar nos poetas, compositores, escritores, figuras ilustres, países que dão nomes às grandes caixas verticais, denominadas prédios. De um lado Castro Alves, do outro Tom Jobim; mas à frente Bethoveen acena de sua janela para a vizinha do Residencial Itália e assim por diante. Quem aqui chega, caso não se assuste com o trânsito que continua caótico, se apaixona. Apesar da verticalidade e imponência de cidade grande, qualquer hora é hora e a cidade ganha ar de cidade pequena. Um ir e vir de pessoas sem fim. Hora de ir ao comércio local, comer uma pizza, saborear um hambúrguer, comer em um restaurante mais sofisticado e, se não quiser nada disso, um petisco, um café, um cachorro-quente também tem bem pertinho, do outro lado da rua. Enfim, opções para todos os gostos e bolsos.
A cidade também conta com uma vasta e diversificada rede de comércio, mercados, drogarias, conveniências, utilidades para o lar, bares e muito mais. Nada como dar uma caminhada pela cidade e encontrar os moradores passeando com seus filhos e pets. Um parêntese aqui para os pets, dizem ser a cidade onde tem mais animais de estimação, até mais que crianças. Não sei se isso é verdade, agora o que tem de animalzinho fofo passeando pelas ruas, me faz acreditar que é verdade. A cidade cresceu muito e, como todo progresso, arrasta uma carga de vantagens e desvantagens, com o crescimento ainda a todo vapor, os investimentos não param. Isso significa que esta jovem cidade há muito ainda por conquistar e por fazer.
Agora, pergunte a quem vive aqui o que acha desta cidade. A maioria ama este lugar, se sente acolhido, diz viver em uma cidade grande com ar de cidade pequena. Pois é, quem diria que há mais de 20 anos, quando aqui cheguei, este lugar iria, um dia, conquistar meu coração como conquistou. Isso prova que tudo faz parte de um processo, de uma fase e certamente muitas ainda virão. Em meio ao tangível, fiz deste lugar minha poesia, minha escrita. Encontrei o lugar pra chamar de meu. Este é o meu lugar!
